A PESTE NEGRA
Pormenor de uma pintura da Flandres (A Peste Negra em Tournai)
http://umolharsobreomundodasartes.blogspot.com/2009/10/acontecimento-peste-negra.html
Muito do nosso imaginário europeu, no que se refere ao século XIV, está ligado a um acontecimento absolutamente trágico - creio mesmo que o mais trágico de sempre, olhando à percentagem (aproximada, uma vez que não se possuem números exactos) do número de vítimas (entre 30 e 40% da população europeia, em média, conforme as regiões - várias dezenas de milhões de mortos, portanto): a "Peste Negra".
A peste, nesses tempos recuados (documentada já no século V a.c., em Atenas, por exemplo, onde Péricles morreu de peste) era um fenómeno habitual, endémico.
Sem perceberem as suas causas (nada se sabia então sobre vírus, bactérias, infecções), julgavam que a peste era um castigo divino. Mas ao mesmo tempo foram percebendo a ligação que existia entre os períodos de peste e a chegada às cidades de comerciantes estrangeiros provenientes de zonas contaminadas.
Não dispondo de meios científicos para a debelarem, só restava a esses homens e mulheres, para além desse controlo de chegadas, a fuga desesperada quando os primeiros casos se declaravam, na tentativa desesperada de se afastarem dos infectados.
Quando já era tarde ou não o podiam fazer, restava-lhes recorrer aos meios de combate disponibilizados (totalmente ineficazes) pelos escassos meios "médicos" existentes: o isolamento dos doentes; as fumigações e a queima das roupas, casas e pertences dos infectados; as rezas e procissões expiatórias (em que os participantes se auto-flagelavam com chicotes e outros instrumentos agressores); as danças místicas; poções e unguentos "mágicos" e pouco mais. São tempos de obscurantismo e, por isso, da prática de atrocidades terríveis: na Alemanha, na França, na Catalunha, por exemplo, as populações culpam e massacram os judeus, acusados em muitos casos de terem envenado a água dos poços.
Médico da época com um vestuário anti-peste
http://pt.wikipedia.org/wiki/Peste_negra
Classicamente as causas desta epidemia, considerada uma "peste bubónica" foram atribuídas a bactérias do tipo da "Yersinia pestis", tendo os ratos e as pulgas como veículos da inoculação principais. Presentes nos ratos, eram essas bactérias transmitidas às pulgas que, depois, ao picarem os seres humanos, lhas inoculavam. Outros meios de inoculação eram possíveis: mordedura de ratos, contacto com cadáveres infectados, inalação de gotículas de saliva contaminada ou contacto com sangue igualmente contaminado.
A evolução da doença era rápida e os sintomas horrorosos: verificava-se o aparecimento de chagas ("bubões") que ao multiplicar-se deixavam o corpo todo negro, daí a designação da epidemia que ficou para a História. Mas um outro tipo de sintomas surgiu também então: uma infecção pulmonar que evoluia mutio mais depressa e se transmitia rapidamente pelo ar (saliva).
Em Portugal terá entrado em Setembro de 1348, tendo sido as cidades e as zonas de mosteiros as mais afectadas. Calcula-se que cerca de dois terços da população terá sido atacada e cerca de um terço não terá sobrevivido.
Mas o pior é que ao surto de 1348-1350 se seguiram outros que, embora menos mortíferos, ainda debilitaram mais - fisicamente e moralmente - as populações: há registos nos documentos de "peste" em 1356, 1361-63, 1374, 1383-85, 1389, 1400, 1414-16, 1423, 1429, 1432, 1437-39, 1448-52, 1456-58, 1464, 1472, 1477-81 e 1483-87, todas elas com correspondência europeia (sigo, A.H. de Oliveira Marques, Portugal na Crise dos Séculos XIV e XV, Presença, p.21).
No entanto, outros estudos têm vindo a alertar para a provável acção conjugada de vírus, de tipo hemorrágico, ou mesmo para o facto de ser essa a causa principal da "pestilência, e estarmos perante uma "peste hemorrágica" e não "bubónica".
No século XVIII a Peste começou a desaparecer da Europa. Em Portugal a última foi em 1899, na cidade do Porto. Hoje a ciência médica dispõe de meios cada vez mais eficazes, embora as epidemias graves continuem a assolar as populações de todo o mundo.