esse verão...
Vinha meio nu
Trazia uma cesta de vime cheia de amoras
que colhera nas margens do rio
Passara a tarde toda de silvado em silvado
Na sua mão direita um pequeno arranhão
- Tão quente tão quente
esse verão
Jorge Sousa Braga
O Poeta Nu
Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]
Vinha meio nu
Trazia uma cesta de vime cheia de amoras
que colhera nas margens do rio
Passara a tarde toda de silvado em silvado
Na sua mão direita um pequeno arranhão
- Tão quente tão quente
esse verão
Jorge Sousa Braga
O Poeta Nu
Seguiam ainda o corpo.
Num instante
tinha mudado o próprio olhar
do verão.
Naquele dia
seguiam
a luz de um demorado crepúsculo.
Quebravam
a queda lenta e branca,
o arco azul.
João Miguel Fernandes Jorge,
Tronos e Dominações, 1985
Hoje sentiu-se no ar o cheiro das flores da poesia! Foi o seu dia!
Regresso, pois, com a Primavera e com o que simboliza em cada ano: a renovação da vida e das cores com que ela se pinta, sol incluido!... E depois os passarinhos, e os ninhos, e os namoradinhos, e os casalinhos, e os pintaínhos... e as flores... e o 2º Período a acabar... e a paragem da Páscoa a chegar...
A Primavera, Sandro Boticelli
E porque foi o Dia da Poesia aí vai uma que já foi falada algumas vezes no 9ºA, por causa da peça de teatro que o Grupo "Natural Invenção" , da escola, anda a preparar para estrear já no próximo dia 26, no decurso do Encontro de Teatro Escolar que a Joaquim de Carvalho está a organizar.
CONSELHO
Sê paciente; espera
que a palavra amadureça
e se desprenda como um fruto
ao passar o vento que a mereça.
Eugénio de Andrade
Os amantes sem dinheiro, 1950
Mas o amor é, sobretudo, alegria e marotice! Venham daí ao século XVI espanhol!...
Que alegres são pró triste enamorado
as iras de sua dama com brandura!
Aquele: "Estais em vós? Mas que loucura!"
Aquele: "Deixai-vos disso, descarado!"
E o benzer-se: "Como haveis entrado?"
E o temer as más línguas com cordura,
o lânguido desmaio e a doçura
daquele: "Ai, que nos ouvem! Que é pecado!"
O falso defender-se, o malefício,
as lágrimas, o "Ai", o "Eu vos prometo!",
o "Creio me enganais como inimigo".
Aquele: "Onde estava eu? Tenho juízo?"
"Como vós me deixais! Guardai segredo".
Não há mal que tal bem traga consigo.
"Jardim de Vénus", manuscrito, Madrid, 1589
In: "Jardim de Poesias Eróticas do Siglo de Oro", Assírio & Alvim, trad. de José Bento, 1997.
Ed. Assírio & Alvim, 1998
Já recorri aqui a este livrinho encantador: "Poemas de Amor do Antigo Egipto".
Em dia de lembranças desse sentimento único que faz a diferença da nossa existência, mas que também nos aperta tanto a barriga e a alma (o coração?) e nos traz, às vezes, tantas sensações amargas, volto a ele (quer dizer, a uma época algures entre 1567 e 1085 a.c.!) Pois... evoluímos pouco, eu sei...
1
Cobarde, por que murmuras todo o dia no teu coração a
palavra do amor?
Porque falas dela incessantemente,
A toda a hora, a qualquer hora
Excepto quando está presente em carne e osso?
Deixa-te disso, homem,
Vai ter com ela, e tenta portar-te como se falasses a sério.
2
Encontro o meu amor a pescar
De pés nos baixios.
Tomamos juntos o pequeno-almoço
E bebemos cerveja.
Ofereço-lhe a magia das minhas coxas
O meu conjuro prende-o.
André Breton (1896-1966)
O poema do Pablo Neruda que vos deixei - ah, e já sei que a edição portuguesa das 20 Canções de Amor... é da D. Quixote, de 1973 (e já ia na 13ª edição, em 2003, data do exemplar mais recente da Biblioteca Municipal), e tem uma tradução do Fernando Assis Pacheco - teve edição em 1924 como vos disse.
Ano importante, para a poesia, esse: em França André Breton publicou o 1º Manifesto do Surrealismo, documento fundador da primeira fase do movimento surrealista que pretendia "dinamitar" as bases (e não só!) do que até tinha sido a literatura e a poesia (e que depois se espalhou para a pintura e escultura, a publicidade e ficção científica, como vamos ver no 9º ano). Como movimento de ideias, estendeu-se a outros campos do pensamento e da actividade humana, modificando fortemente o gosto e a cultura de massas da primeira metade do século XX (mas não só, porque continua vivo, embora mais circunscrito a no alcance e no número dos seus cultores-mentores).
Frases como estas são elucidativas:
"Não temos nada a ver com a literatura. No entanto, quando é necessário, somos capzes de nos servir dela, como outros quaisquer." (Declaração colectiva de Janeiro de 1925);
"O surrealismo não é um novo ou mais fácil meio de expressão e ainda menos uma metafísica da poesia. É um meio de total libertação do espírito e de tudo o que se lhe assemelhe" (idem);
"Somos especialistas da Revolta... O surrealismo não é uma forma poética. É um grito do espírito" (idem).
(cont.)
Salvador Dali, Nascimento de desejos líquidos, 1931-32
Já agora, ainda a propósito da poesia do chileno Pablo Neruda, espreitem e vejam como
ele próprio a disse (imagens dele também):
http://www.youtube.com/watch?v=Dz6YQMEOIug
E já agora ouçam e vejam como a musicou uma das referências da canção chilena dos anos 70 - Victor Jara (torturado e assassinado, em 1973, pelos fascistas chilenos após o golpe de estado que derrubou o governo democrático de Salvador Allende, que foi assassinado também).
http://www.youtube.com/watch?v=QIhHTGYkkHU&feature=related
e como outros lhe pegaram, depois:
http://www.youtube.com/watch?v=1rpNL-3Mu-g&feature=related
Que vos parece?
Tem andado arredada cá do blogue a poesia...
Faz falta! E como continuo a descobrir que no youtube não há só música ou filmes documentais, mas também da dita - como aliás já ao princípio vos propus naquele post do Paco Ibanez - aí vai uma pequena surpresa para um grandessíssimo (e um tanto esquecido ultimamente) poeta: PABLO NERUDA (1904-1973).
http://www.youtube.com/watch?v=wa-PtGBJCyg
E agora o poema! Disfrutem e digam-me se gostam! Façam a vossa leitura! E pq não enviá-la para o youtube?
ME GUSTAS QUANDO CALLAS
Me gustas cuando callas porque estás como ausente,
y me oyes desde lejos, y mi voz no te toca.
Parece que los ojos se te hubieran volado
y parece que un beso te cerrara la boca.
.
Como todas las cosas están llenas de mi alma
emerges de las cosas, llena del alma mía.
Mariposa de sueño, te pareces a mi alma,
y te pareces a la palabra melancolía.
.
Me gustas cuando callas y estás como distante.
Y estás como quejándote, mariposa en arrullo.
Y me oyes desde lejos, y mi voz no te alcanza:
Déjame que me calle con el silencio tuyo.
.
Déjame que te hable también con tu silencio
claro como una lámpara, simple como un anillo.
Eres como la noche, callada y constelada.
Tu silencio es de estrella, tan lejano y sencillo.
.
Me gustas cuando callas porque estás como ausente.
Distante y dolorosa como si hubieras muerto.
Una palabra entonces, una sonrisa bastan.
Y estoy alegre, alegre de que no sea cierto
(http://www.tinet.org/~elebro/poe/neruda/neruda22.html)
Andei à procura de uma tradução mas não opto por nenhuma das que espreitei. Isto de traduzir poesia tem que se lhe diga... Está publicado em livro - é o Poema 15 de 20 Poemas de amor e uma canção desesperada, de 1924 - mas não o tenho. Vou tentar encontrá-lo com mais tempo! Entretanto, se vos interessar, é só pesquisar, ou pelo autor, ou pelo título em português - Gosto quando te calas -, ou pelo livro, ou em conjugação dos três!
mesmo sem gente nenhuma que te ouça,
poema intrínseco dito a português e dentes,
a sangue desmanchado,
com a estria lírica a fervilhar de riscas
rudes, frescas, roucas,
tu que como iluminas pela boca fora
Herbero Helder, A Faca Não Corta o Fogo, 2008
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.